quarta-feira, abril 13, 2005

Dormes todos os dias na minha cama.
Sentes a água que escorre na pele escamada pelo sol quando todas as manhãs tomo banho.
Bebes da minha chávena, adoras o mesmo chá que eu bebo.
Bebes da minha boca, ouves com os meus ouvidos e sabes que as palavras que te dizem são as mesmas que oiço contigo.
Adormeces quando fecho os olhos, acordas quando bocejo.
Lês os meus livros, ouves as minhas músicas, escreves com as minhas mãos as coisas que te digo quando estou sozinha.

Cais nos mesmos enganos, levantas-te e puxas-me ao mesmo tempo.
Corres enquanto eu não me canso, e cansas-te sempre que salto demais.
Não sabes voar. Nem eu.
Mas sabes que é facil ver o mundo de cabeça para baixo e sentir que tens os pés no céu.
Como eu.

Apareces nos meus retratos, tens o teu cheiro nas aguarelas que pinto, nas roupas que visto, nas que dispo. Tens o teu rosto no meu espelho, as unhas nos meus dedos, o sinal perto do umbigo, outro no meio do rosto.

Como eu.

E tens os olhos iguais aos olhos que eu imagino que têm os anjos.
Castanhos, grandes, com rugas nos cantinhos.
Tens os cabelos compridos, como sempre li que tinham as princesas.
Tens um jeito desengonçado de andar pela rua, tropeças com sapatos altos e ris-te muito quando te apaixonas.

Tens tudo o que eu sou.
E percebi que só contigo é que eu posso andar pelo mundo sempre com a certeza que és o meu porto seguro toda a vida. O meu caminho para todos os outros apeadeiros onde passar. Talveaz outros portos onde atraque.
Talvez outras mãos, outro rosto no meu espelho, outros olhos, de outro anjo.

Talvez tudo. Talvez para sempre.

(acordo de manhã e nunca durmo acompanhada. No espelho do meu quarto não vejo nada atrás de mim. Tomo banho sozinha, vivo com os olhos arregalados e os cabelos torcidos numa trança.
Agora, antes de dormir, sorrio para dentro. Apaixonei-me por mim.)



13.04.05
*Mó

1 comentário:

Patrícia Mota disse...

Que bom Mónica. Deve ser muito bom querer estar exactamente onde estão os nossos pés. Nem que isso seja de pernas para o ar.

Não sei onde vais nem onde queres chegar, mas parece-me que esse é um bom caminho.

Beijo*