sábado, abril 23, 2005

Agarro-me ás paredes. Agarro-me ao corrimão das escadas e desço os degraus dois a dois.
Agarro as mãos ao volante, os olhos ao relógio que nunca esteve certo.

Como qualquer coisa, bebo um copo de água morna e saio de mim.
Mais uma vez, mais uma coisa qualquer por digerir.
Mas é só amanhã que penso nisso.

A saia pelo joelho e o casaco deixado para trás.




Começa a luz a descer, alinho as garrafas todas e separo os copos um a um. Pergunto se demora muito, se amanhece já daqui a um bocadinho ou se é paz que encontro quando procuro uma má refeição...para uma má digestão de amanhã.

Ele saiu dum buraco qualquer. Um dia encontrei-o por cá e perguntei-lhe o nome, hoje ele veio, mas não lhe perguntei onde vive. Não lhe disse o meu nome e ele perguntou-me pelas asas.

"A fadinha desceu à terra."


Disse-me que não sabia onde é que eu ia, que nunca soube donde vim. Nunca chegou lá.
Não voei.
Não quis.

"Vai embora. Não chego tão alto."

"Fico. Hoje posso ficar."

Não cheirava a ti. Não bebe o mesmo vinho que tu. Não sabia a ti nem me perguntou onde é que tu estavas.

"Adoro-te princesa."


Só lhe cravei um sussurro lento nos lábios. Não eram os teus lábios, nem eram as tuas mãos nas minhas costas. Nem o fumo dos teus cigarros de madeira polida.
Era vadio aquele lugar onde ele estava, donde me pedia para fugir e depois me puxava para ficar.
Eu fiquei.

"Desci do céu para o levar comigo."

Ensinou-me que se seguram na mão os copos que pousei na mesa. Expliquei-lhe que na mão eles caem.

"Eu não posso subir outra vez."

E agarrou-me com a força duns braços que não conseguem pedir para ficar nem sabem mais dizer adeus.

"Não foi por ti que desci. Por isso fico hoje."

Ele não sabia a ti.
Mas sabia à terra, ao lugar vadio donde saiu e onde faz pose para as fotografias das vidas de quem por ele passa.

Quem nunca fica.

Apertei o casaco, faz frio lá fora. Ele estava abraçado à porta, de olhos fechados, a um vazio qualquer.
E eu saí. Com a digestão bem feita e com os braços cansados, de alguém que não consegue dizer adeus.
A ti, meu amor, que és do céu que eu deixei para trás quando te vi descer.


23 .04.05
*Mó

3 comentários:

Anónimo disse...

My biggest wish is to spread the truth to those who haven't heard it. If God gave me the desire, why didn't he give me the talent?

Anónimo disse...

belo sonho, pena apenas as tuas palavras serem verdade, se perder quem quero nao será por te querer a ti mas por ela nao m saber querer, eu quero o tal " vazio qualquer"...... joel

Anónimo disse...

é sempre verdade as coisas que tu ves nas verdades a volta.
o vazio não é ela. Nem tu és, em nenhum momento do texto, quem eu chamo na segunda pessoa.

Sei bem, antes de tudo, o que não quero...
beijos, joel, "de nenhum fruto queiras só metade"...serve para os dois, afinal.
Sê mto feliz *
*Mó